quinta-feira, 1 de julho de 2010

Introdução

O olhar pesaroso denunciava mais do que as palavras que o atingiam como um tiro, tinha a certeza que só ouvia meia verdade.
Estava apático, sentia um turbilhão de sentimentos no estomâgo como se fosse um vulcão em início de actividade.
Rafael era um homem habituado às vicissitudes da vida, tudo para ele era um desafio aliciante e confiava em si mesmo acima de qualquer coisa.
Sentiu que tinha pregado uma rasteira a si próprio e não estava preparado para tal.
Apressou-se na despedida, precisava de se sentar ao volante da sua mota e libertar-se de toda a tensão acumulada. Sabia que quanto mais enrola-se o punho no acelerador, mais concentrado estaria na estrada e por breves momentos aquelas frases deixariam de ecoar na sua mente.
Deu por si já à porta de casa, cruzou o largo portão automático e lembrou-se que não tinha ninguém à sua espera para o confortar. O silêncio imperava em casa e era nele que se sentira sempre bem.
À medida que os seus pesados passos atravessaram o hall deixou escorregar pelos dedos o casaco e o capacete. A casa estava fria e sentiu um arrepio gelado a percorrer-lhe a espinha.
Nunca tinha perdido a cabeça, era o seu trunfo em qualquer circunstância, conhecia os seus limites e sabia que podia manipular qualquer pessoa antes de ceder.
Agora o problema não eram os outros, mas sim o seu corpo.
Entrou na biblioteca e olhou para a poltrona ao canto. Herdou-a após a morte do pai, destoava da decoração simples e moderna da sua casa, mas o cheiro da pele e o seu aspecto usado despertava-lhe memórias reconfortantes, para ele isso era suficiente.
Sentou-se, tapou a cara com as mãos, sentiu as pernas a tremerem pela primeira vez na sua vida, tudo aquilo era uma novidade.
Olhou pela janela e viu as luzes da cidade ao fundo, lá fora tudo permanecia igual e ali dentro o seu mundo desabava. As lágrimas começaram a cair sem aviso prévio, era tempo de ganhar consciência da sua triste realidade.

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