O ano de 2010 prometeu dar-me luta logo nos primeiros dias.
Lembro-me de tudo como se fosse hoje, acordamos atrasados, ainda cansados da passagem de ano. Saimos de casa apressados porque já nos esperavam em Almada.
O céu estava cinzento, não chovia mas o piso ainda estava molhado. Acelerei em direcção ao Eixo Norte Sul, com a confiança habitual, ao som de uma música animada e com a certeza que chegariamos a horas ao destino.
Desci o Aqueduto, ultrapassei uma carrinha e esta colou-se imediatamente à minha traseira.
-"Não estou a perceber o que este pretende..." - pensei eu...
Encostei-me à direita...entrei na curva...senti a traseira do carro levantar, as rodas deixaram de tocar o chão como se tivessem pisado óleo e perdi o controlo de tudo.
-"Já está!" - disse o R.
Não larguei o volante, não pensei que ia morrer e não gritei, nestas alturas não existem heróis ou manobras mirabolantes. A curva era para a direita e a frente do carro ficou virada para o separador, continuei o movimento do volante para a direita e acertei como uma chapada no separador.
Vi o pára-choques a voar...o carro fez vários peões e acertou no separador central, novamente de frente como uma chapada.
Ao fim de outros tantos peões o carro parou...
Não olhamos um para o outro, não pensamos em nada, tinhamos de sair dali...antes que fossemos atingidos por outro carro.
Tinha a frente do carro desfeita, comecei a chorar copiosamente...não por mim, não pelo carro mas pelo perigo que ele tinha corrido por minha causa.
Fizeram uma barreira de protecção à nossa volta. Retiraram o carro para a berma, todos se mostraram prestáveis e agiram como verdadeiros anjos da guarda.
Eu sabia que 90% do motivo de estarmos bem tinha sido pelo factor sorte...e nada mais do que isso.
Na estrada podemos ser condutores confiantes e conscientes mas tudo muda num segundo, por uma estrada molhada, por óleo derramado, por uma distração...
Demorei muito tempo a digerir tudo o que passou, revia o momento do primeiro impacto no separador várias vezes por dia e chorava sempre.
Ontem, 6 meses depois, voltei a passar no mesmo sítio, com o mesmo carro, e novamente os dois juntos...vi as marcas de travagem no alcatrão, vi os separadores arranhados, senti-me pequenina e impotente mas enfrentei o medo.
E hoje, escrevo aqui sobre tudo isto, porque não o consigo expressar em voz alta, porque sei que sempre que ali passar vou-me sentir o ser mais vulnerável do mundo e porque independentemente de ter culpa ou não do sucedido, sei que estamos demasiadas vezes no fio da navalha.
ha coisas na vida, que nos marcam como uma tatuagem.
ResponderEliminarE permanecem como um pesadelo.
Mas ha que procurar enfrentar esses fantasmas.... até porque estás viva!
é difícil, mas ultrapassaste.
Estou orgulhosa, sei bem que até este texto te custou imenso a por cá fora. Conseguiste exteriorizar mesmo que não tenha sido em voz alta e isso é importante. *beijo grande
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